Terça-feira, 27 de Setembro de 2005
Estórias 5
Depois da trovoada
Depois da trovoada vem a bonança, dizem sem grande convicção ou
apenas por dizer – pois também é legitimamente verdade que depois da
bonança vem a trovoada. Então percorro o lugar onde outrora houve um
rio, gente e trigo. Ali houve também vento. E árvores. Lembro,
então, os céus. (É verdade que vivemos enquanto sonhamos).
Numa tarde qualquer (mas acontece que já foi há muito tempo atrás,
quando me suicidei) alguém me confessava atónito: «mas... não há
morgues no céu?».
Não, não há, nem vi a carcaça dos deuses antigos.
Nem um ninho esmagado entre as nuvens ou um pássaro morto.
Não é verdade o que o poeta assegurava com ingenuidade e
inocência: «os pássaros quando morrem caiem no céu».
Demasiado mentem, os poetas!
A.r.