A fada Oriana estava aflita com o Poeta. Perdido na sua torre escura, cantando versos ao luar o Poeta tinha-se esquecido que prometera escrever uma toada de Natal. Os animais da floresta, preocupados com a demora, dirigiram-se à Torre para o procurarem. Em vão. O poeta desaparecera. A fada lembrou-se então que a Torre dava para as terras dos elfos. Veloz, procurou a Torre e descendo às masmorras encontrou a pequena porta por onde o poeta, certamente, se escapulira. Voou em direção ao castelo de Alf, o elfo rei e pediu-lhe ajuda para procurar o Poeta. As terras dos elfos ficavam num pequeno oásis escarpado, por onde corriam altas cascatas de água. O Castelo parecia suspenso no ar. Um clima doce e luminoso rodeava toda a pequena vila de elfos. A partir do castelo, campos verdes envolviam o oásis e o castelo.
Mas onde estaria escondido o Poeta que gostava tanto da sua torre negra e, de cantar doces versos ao luar? Não parecia dele ter-se escapulido para a terra dos elfos. Alf pediu a Oriana que esperasse pelo anoitecer, porque então, teria alguém para a auxiliar a encontrar o Poeta. Oriana esperou então, no majestoso Salão dos Ancestrais, onde os elfos preservavam o Poço de Vidência através do qual se podia escrutinar todo o mundo. O elfo rei explicou a Oriana como isso era possível – o mundo é recoberto por uma trama de linhas de energia que a reveste como uma pele. Essas linhas e o espaço entre elas são as escamas do dragão cósmico Morgür cujas veias alimentam a vida das plantas e animais e auxiliam as montanhas e os rios a crescer. Mas o dragão cósmico existe mesmo, e a sua mente é o Naos, o espírito onde tudo mergulha e donde tudo emana. Os elfos da luz, num labor de evos, aprenderam a conhecer o Naos e construíram o sagrado Poço da Vidência, que era como uma janela ou um olho aberto sobre os segredos do Naos, cuja momentânea contemplação por um mortal o arrastaria instantaneamente para a loucura. Mesmo entre os elfos e fadas, nem todos tinham o poder e a energia para suportar essa visão, e só um elfo entre eles tinha o poder de usar o Poço como uma porta mágica. Explicado isso, o elfo rei pediu a Oriana para ser paciente, e Oriana esperou pela noite, que chegou mansamente como uma névoa escura, e a noite trouxe Sigvar, uma mulher-elfa oriunda de Svartalfheim, o reino dos Elfos da Escuridão. Sigvar entrou no Salão dos Ancestrais, relanceou os olhos por Oriana e pelo elfo-rei e, de seguida, demorou o seu olhar na superfície de chumbo do Poço da Vidência. Oriana não tirou os olhos dela, e não sentiu medo quando Sigvar se aproximou deles como os seus olhos brancos como marfim, nem quando lhe vendeu os olhos e a conduziu ao Poço. Oriana percebeu que subia uns degraus e que mergulhava no Poço, não como se caísse numa falésia, mas antes, como se flutuasse nos ares como uma hidra a planar. Sigvar estava ao seu lado, e em volta deles uivavam seres mágicos cuja passagem lhe inundava o íntimo de vagas de prazer e clarividência.
Quando sentiu o solo sob os pés, Oriana sentia-se feliz, preenchida, ressumando magia e poder. Sigvar tirou-lhe a venda e pareceu esfumar-se em seguida. Oriana estava numa floresta escura, e o Poeta estava diante dela. Tinha caído no fundo dum barranco quando regressava da Fonte das Musas com a lira dourada que aí fora pedir. Oriana ajudou-o. Tirou-o do fundo do barranco e sarou as suas feridas enquanto o Poeta lhe explicava que fora em busca da lira dourada para compor a toada de Natal que prometera, porque desejava que ela fosse maravilhosa e inesquecível. Oriana conduziu-o de regresso à Torre Negra, acompanhados por um séquito de animais da floresta que saudavam o regresso do Poeta. Entraram pela mesma porta por onde o Poeta saíra, e Oriana conduziu-o ao seu quarto para que o Poeta descansasse antes de retomar os seus versos e as suas canções. Olhando o vale pela janela do quarto do Poeta, e lembrando-sedo quanto devia à mulher-elfa, Oriana interrogou-se sobre onde estaria Sigvar naquele instante. Talvez os estivesse a ver pelo Poço da Vidência, ou talvez isso não fosse preciso, porque Oriana, o Poeta, os animais, a Torre e tudo o mais, não eram seres distintos e distantes, mas partículas diferenciadas de Morgür, irmanadas entre si como árvores unidas pela raiz.
conto de Maria e José.