Sempre gostei de anatomia comparada. Compreender regularidades, compreender o processo evolutivo através da busca de semelhanças ancestrais. Nos animais como na sociedade. Resta-me agora procurar as diferenças e amá-las também.
Esqueci-me dos cigarros e pedi um a um colega. Depois fizemos contas à vida e discutimos o futuro sombrio que se avizinha.
ou
O que une duas pessoas? A circunstancia de frequentar o mesmo espaço ou a cumplicidade de um olhar? Passamos os dias fumando cigarros e só descobrimos a solidariedade quando estamos angustiados. Procuramos a amizade num outro momento, quando os nossos dias se transformam num calvário ou procuramos partilhar o sorriso? Ou não sabemos e somos baratas tontas, derreados, tristes, sem metas e objectivos?
Hoje li um conto que falava sobre o valor da amizade quando só uma das partes pratica. Uns falam outros vivem.
ou
A teoria nem sempre segue a prática. Há quem passe a vida a falar e a enredar-nos nas suas palavras e se esteja nas tintas para nós. A hipocrisia segue-nos no caminho. Desbravamos o coração, procurando sempre novas formas de agradar ao amigo mas, por vezes, a recompensa é um fechar de rosto que nos angustia. Damos a vida pelo sentimento ou damos a vida pela pessoa concreta?
Hoje a Ana foi a uma festa. Nessa festa trabalhavam dois palhaços. Balões, mímica e maquilhagem. No fim a Ana ficou transformada em Kika a mulher palhaço.
ou
Adultos e crianças num espaço aberto. Descontracção, riso, sol, comida, palhaços. Cada qual escolhe a sua forma de relaxar do longo ano, do duro Inverno que passou. Foi um Inverno frio e branco naqueles lados da Serra. A duplicidade a matar a cumplicidade. A traição da chuva, o gelo a derrubar o trigo, a derrubar o sossego da telha. O trabalho, os olhar duro e determinado, o golpe de sorte. Finalmente o Verão. E os palhaços.
Ontem a Ana encontrou um pardalito morto. Foi-me chamar, pegou-me pela mão e mostrou-mo. «Temos de fazer um funeral» diz-me ela. Porém, foi incapaz de pegar no corpo do pássaro. Mas verificou que a terra o tinha encoberto. Repousa no canteiro, agora.
ou
É uma estrutura de ossos leves e penas. Estava morto, repousava no duro chão de cimento. Como fugir às formigas e às varejeiras se a decomposição se torna tão atraente? O corpo, a decomposição, a morte. Que venha a terra e nos retire da retina o espectáculo horrendo.Do ar, das nuvens, do céu aberto para a terra. Honremos o corpo e façamos o funeral.